Me sinto recompensado quando alguém fala o que estou pensando. Vale para escrever, também, e hoje me inspiro em um comentário registrado ontem, durante um programa de debates. Um participante, recém-chegado nesta emissora e dono de raciocínios contundentes e nem um pouco evasivos, disse não compreender por que tamanha hesitação do ex-presidente Jair Bolsonaro em voltar ao Brasil. Em resumo, ele considerou que o roteiro de meias palavras, utilizado pelo capitão desde sua derrota nas urnas, o enfraquece como líder da oposição.
Porém, disse ele, Bolsonaro também “não desocupa a moita” para que seja ocupada por alguém. Em sentido figurado, disse que o ex-presidente colocou uma plaquinha de “moita ocupada” e assim persiste, dizendo mais. Quando mais se esperava que se filho anunciasse uma decisão, ele vem à internet fazer propaganda de calendários. Ressalto que este comentarista é antipetista, advogado, crítico do STF e não é exatamente bolsonarista, vamos dizer assim, por isso sua consideração é relevante. E daqui por diante sigo por minha conta e risco. A mim me parece claro que as “férias” do ex-presidente tiveram o primeiro objetivo de afastá-lo das retaliações petistas que por certo viriam – como vieram. Em segundo lugar, oferecer-lhe tempo para que soubesse, através de seus advogados, as situações que enfrentaria na Justiça sem a manutenção do foro privilegiado, risco de pedido de prisão, incluído.
Finalmente, retirá-lo dos holofotes negativos da grande imprensa, que naturalmente – como vêm fazendo – exaltariam os contrapontos da nova administração petista – nas áreas da saúde, cultura e Amazônia, por exemplo, como está claro. Porém, a estratégia teve de ser alterada devido aos episódios de 8 de janeiro. O mais provável e que a situação tenha saído de controle, da quebradeira às prisões, e sua responsabilização – direta ou indireta – é o que mais lhe incomoda atualmente. Tornar-se um mártir, convenhamos, não é exatamente uma opção, é uma mera possibilidade, e eis o que temos agora: um trapo na boca de uma vaca. A primeira situação é como chegar ao Brasil: carregado por seus apoiadores ou tendo que enfrentar, já no aeroporto, a Polícia Federal?
A primeira hipótese soaria como afronta e, a segunda, como derrota, e eis o “x” do primeiro ponto. O segundo, como será a orientação desta nova fase? Como serão os discursos, as reuniões, os encontros com políticos e populares? De confronto? Serão considerados “disseminação do ódio”? E se assim o forem, será ele preso preventivamente por este “crime”? Esta decisão não será fácil nem para Alexandre de Moares devido aos riscos que a compõe, o que fazer? Bolsonaro, a cada dia que passa, vê diminuída sua estatura como líder da oposição, observando sua base se esfacelar em troca de cargos e emendas, como era previsível. Restaria a ele o samba de uma nota só, ou seja, manter-se atuante apenas pelos apoiadores raiz? Estas respostas ainda não foram encontradas, o que retarda sua volta do Brasil, mas uma coisa é certa: está na hora de opiniões inteiras, sem meias-palavras, pois é isso que se espera de alguém que pretende continuar na política. Enquanto elas não estiverem devidamente formuladas, o impasse seguirá. E março já chegou.