Autoridades que investigam acidentes aéreos raramente apontam para uma única causa. Costumam dizer, nestas tragédias, que um “conjunto de fatores” provocou a queda de uma aeronave. Recentemente, nos Estados Unidos, em sua primeira aparição púbica diante de um grupo de apoiadores, o ex-presidente Jair Bolsonaro tentou justificar sua derrota nas urnas: “fizemos o possível, não entendo o que aconteceu”. E continuou: “minha popularidade nunca esteve tão alta”. Na mesma semana da proclamação do resultado, instado por um amigo a opinar sobre a causa da derrota de Bolsonaro, poderei da mesma forma: foi um “conjunto de fatores”.
Vamos lembrar. Bolsonaro, há pouco menos de cinco anos, conseguia alguma luminosidade midiática quando chamava parlamentares de feias ou brigada com repórteres. Então candidato, se tornou um representante do machismo estruturante, mais tarde um caçador de petistas. Por este segundo aspecto, tripudiando sobre a prisão de Lula, ele se tornou presidente pela contundência de seus ataques diante da disposição dos eleitores de afastar o PT do Palácio do Planalto. Porém, os anos de poder, festejados por agrupamentos que, sem a menor razão lógica, o colocaram na condição de “mito”, não foram devidamente compreendidos pelo então presidente. Ele passou a acreditar que, ao manter suas posições como candidato, converteria outros simpatizantes para um alinhamento – ainda – em construção. Se teve o mérito de confiar a economia brasileira a um competente gestor, que devolveu o Brasil aos trilhos depois da pandemia, teve deméritos que minaram a sua imagem como presidente de uma nação.
O primeiro, talvez não o principal, sua manifestação sobre saúde pública. Embora, em essência, ele não estivesse de todo o errado, referindo-se à manutenção da solidez econômica, a maneira de verbalizar essa intenção foi inadequada, chamar de “gripezinha”, por exemplo, quando clamava-se por vacinas. Um outro aspecto: sua falta de empatia diante de tragédias naturais. É evidente que o sobrevoo de uma autoridade pública em áreas arrasadas não faz muito diferença prática, mas demonstra um bem caro aos brasileiros: a solidariedade.
O governador “carioca” Tarcísio de Freitas, não somente se uniu ao Litoral Norte durante o carnaval, como transferiu seu gabinete para São Sebastião, de onde despacha. E, em seus pronunciamentos até hoje, se refere às comunidades com a desenvoltura de um caiçara. Tarcísio, em sua primeira prova de fogo, mostrou-se à altura do cargo e Lula, mesmo com uma aparição relâmpago, também fez o dele se esperava: exibiu solidariedade. Ou seja, um político não deve perder janelas de aparição significativas, necessárias, e isso faltou ao ex-presidente, também. Estão vendo porque um avião não cai apenas por um motivo?