O ex-presidente do Uruguai, José Mujica, que recentemente posou no interior de seu Fusca azul ao lado de Lula da Silva, revelou em uma entrevista concedida a revista Veja o seguinte: “A esquerda brasileira errou, permaneceu estagnada no tempo e presa na literatura de uma época em um mundo que mudou. Esquerda é empatia, é solidariedade e é preocupação com a desigualdade. É sonhar com um mundo um pouco mais justo e com uma humanidade mais nobre. É o que a esquerda tem de mais bonito”. Portanto, considerando este raciocínio como um ideal, podemos descarta-lo como fórmula, porque no fundo é um roteiro de boas intenções. E não há nada de errado disso, mas a questão é menos semântica e mais concreta. Desde a globalização econômica mundial, misturaram-se não apenas produtos, mas culturas e propostas de vida, incluindo relações de trabalho.
Neste particular, a pandemia, fato mais recente, abriu novos horizontes os quais, em alguns países, eram normais, em outros, nem tanto. Disciplinar o trabalho à distância, até hoje, proporciona um rico debate sobre mando e subordinação ou, se preferirem, desmando e insubordinação. E isso me faz recordar algo que defendo há décadas: trabalhar, essencialmente, é cumprir uma determinada tarefa dentro de um tempo previsto. Portanto, a questão de número de horas em atividades nas quais a presença física não seja essencial, é discutível. Porque, tarefa concluída, trabalho pronto. Em países desenvolvidos as obrigações trabalhistas, como conhecemos aqui, praticamente não existem. Isso explica porque nos Estados Unidos, quando a Covid-19 decretou a paralisação de vários negócios, provocando demissões em massa, esses trabalhadores foram readmitidos rapidamente quando a economia engrenou novamente. Porque o custo da demissão é igual a zero, ao contrário do Brasil, onde a proteção ao trabalho formal impõe custos avassaladores.
Lula, durante a campanha, voltou com o papinho de sempre – eis a esquerda envelhecida, aqui –, prometendo uma nova reforma trabalhista e, claro, fortalecer os sindicatos. Essa discussão é pior do que aquela da terra plana, porque o que possuímos nesta matéria já é algo insuportável para os empresários, e são garantias que dificilmente deixarão de existir – como férias, décimo-terceiro e multa rescisória, as nossas jabuticabas. E não é que durante a semana, o seu ministro do Trabalho, um sindicalista de carteirinha, declarou que pode substituir os serviços prestados pela Uber pelos Correios? Para “proteger os motoristas”, disse ele, e isso é mais uma prova do envelhecimento da esquerda: colocar as pessoas no colo do Estado. O ministro deveria saber que estamos fartos disso, que as relações de trabalho avançaram, são mais livres e rentáveis para as duas pontas da corda. Marinho deve ser daqueles que ainda ouve música em gramofone, para prestigiar o emprego de quem os conserta. Só pode ser.