Parecia uma catástrofe. Eu reiniciava incessantemente o notebook e nada.

Foi no início da pandemia.

Meu notebook não era dos mais novos, mas estava longe de ser velho a ponto de travar daquela forma.

Desde os tempos da Onodera e com a chegada dos smartphones eu fui deixando de dominar as panes nos computadores. Fazia uns bons anos que eu não me estressava com máquina que se negava a iniciar.

Até hoje eu não sei o que houve de fato, mas a verdade é que foi preciso formatar a máquina e lá estavam salvas boa parte das nossas fotos.

Não foi a primeira vez que perdi fotos. Em 2007 um outro computador pifou e levou as lembranças da nossa viagem a Manaus para o casamento do meu cunhado. Fiquei uns dias de luto, parecia que eu deixara de ver o encontro das águas que tanto me emocionou só porque não tinha mais as fotos. Depois passou, eu aprendi cedo a criar outros enredos para coisas ruins que me acontecem – coisa de escritor. 

A eutanásia que tive que aplicar no notebook levou embora a nossa segunda viagem à Disney, em 2016 quando levamos nosso pequeno candidato a astrônomo à Nasa. Só descobri tempos depois porque eu fui buscar na nuvem uma foto dele no jardim dos foguetes e descobri que não estavam mais lá.

Quase morri.

A nuvem salvou até setembro de 2016 e depois saltou malandramente para janeiro de 2017 levando embora nosso outubro em terras norte americanas.

“Que catástrofe!”

Foi o que eu pensei por alguns minutos até perceber que perder arquivos de fotos é praticamente inevitável desde que deixamos de usar os velhos filmes de doze, vinte e quatro ou trinta e seis poses com os quais fotografei minha primeira ida à Disney em 1989.

Somos reféns da tecnologia que criamos. 

Dependemos do espaço na nuvem, da memória das máquinas, das atualizações e das bençãos dos deuses da computação para que possamos ver de novo o filho de cinco anos correndo e rindo em meio aos foguetes do Cabo Canaveral como se os conhecesse há séculos.

As fotos não encontrei, porém, a minha memória se lembra de cada segundo desde que ele soltou a minha mão e saiu correndo em direção aos foguetes. Tínhamos mais fotos na Nasa do que em qualquer outro dos parques. Crianças não têm medo do espaço e não são egocêntricas a ponto de não admirarem a imensidão do universo e provavelmente por isso a Nasa é tão encantadora para eles.

E foi pensando no tamanho insignificante da terra que eu encontrei acalento para o desaparecimento das fotos.

O que são aquelas fotos perto daquele dia que vivemos intensamente?

O que somos nós perto dos quase seis bilhões de seres humanos deste planeta?

O que é este planeta no meio dos outros que conhecemos?

O que é a nossa galáxia comparada ao universo?

E foi justamente neste movimento de consciência da nossa insignificância que eu percebi como somos importantes para os outros com quem escolhemos conviver e partilhar momentos inesquecíveis como os que vivemos naquele dia mostrando naves espaciais, foguetes e roupas de astronauta para nosso pequeno Arthur.

Somos nada, entretanto somos tudo para os que nos amam e para quem amamos.

Tiremos menos fotos!

Aproveitemos mais os momentos!

Nossa verdadeira nuvem de armazenamento é a nossa memória.

E se todas as nossas fotos desaparecessem? O que seria de nós?

Quem somos nós longe das câmeras, das telas, do armazenamento de fotos?

E se nos fosse dada a chance de viajar sem fotografar absolutamente nada?

Seriamos capazes de desfrutar?

Conseguimos existir sem mostrar a nós mesmos que existimos?

Viver não é fotografar.

Viver é viver.