Ao Congresso Nacional.
Nesta data, e por este instrumento, deixando com o Ministro da Justiça, as razões do meu ato, renuncio ao mandado de Presidente da República.
Brasilia, 25.08.61
Jânio da Silva Quadros


Esse é o bilhete de renúncia do então presidente da República, Jânio da Silva Quadros – um bilhete, sim, apenas um bilhete – deixado junto ao seu então Ministro da Justiça, Oscar Pedroso Horta. Então, hoje é uma data histórica para o Brasil e que culminou, três anos depois, com o golpe militar e a ditadura, que durou até 1985.


Ainda durante o período ditatorial, mas já com eleições estaduais proporcionadas pela abertura lenta e gradual do regime, Jânio Quadros se candidatou, pelo PTB, ao governo do Estado, 21 anos depois desse ato tresloucado de Jânio, cuja intenção, oculta, mas nem tanto, posteriormente relatada pelos historiadores, era um autogolpe, para se manter no poder e alcançar poderes ditatoriais. Jânio esteve em Limeira em 1982, em campanha, e me recebeu para uma entrevista e um almoço na casa do então candidato a prefeito pelo PTB, Oswaldo Terence, momento também acompanhado pelo saudoso amigo Walfrido Salvi – ainda não nos conhecíamos pessoalmente – então candidato a vereador.


E esta foto, onde apareço segurando um gravador para fitas K-7, da Phillips, se não me engano, entrevistando-o, dá bem o significado do que era Jânio Quadros, quando olhamos através de seus olhos esbugalhados. Figura carismática, persuasiva, e profundo conhecedor da política e das letras, além de artista plástico, Jânio falava solto, fluente, explicando tudo o que de folclore havia sobre ele. Só não abriu mão, entretanto, de manter o segredo de sua renúncia. Essa foto, aliás, foi me presenteada pelo professor Walter Pinto, que era o candidato a vice-prefeito na chapa de Terence e também esteve no almoço. Jânio só tomou suco de laranja. Se estava batizado, eu não sei.


Aí podem me perguntar: por que dessas lembranças agora? Bom, primeiro pela data de hoje, 25 de agosto, o aniversário de sua renúncia. E, principalmente, pelas semelhanças entre Jânio e Bolsonaro, pelos tons populistas que empregam em seus discursos. O sonho de Jânio era ver sua renúncia não aceita pelo Congresso Nacional, pelos próprios militares e pelo povo, para poder instaurar uma gestão personalista à frente de Brasília e, provavelmente, ditatorial. Tratava-se de uma tentativa de autogolpe, que também é o sonho de Bolsonaro. Disso não tenho mais dúvidas. Mas como ele vai conseguir, difícil saber.
Não vai ter coragem de renunciar, por sua própria vaidade e por que se o fizer, o vice assume de imediato. O que vai pela cabeça dos militares é difícil de saber, mas a interlocutores afirmam e reafirmam que não vão apoiar nenhuma aventura golpista. Então sobra ao atual presidente da República o discurso inflamado, para acender suas bases ferozes e, quem sabe, tentar um golpe através dessas bases, invadindo Congresso e STF, para um quebra-quebra planejado.


Suas bases fundamentalistas estão se preparando para isso, inclusive convocando as pessoas para o 7 de Setembro, para que compareçam armadas aos manifestos. Bolsonaro não tem alternativa para se sustentar a não ser o seu discurso tosco, através das mentiras que transmite feito verdades. Busca nas trilhas dessa retórica inflamar a turba, os 25% do eleitorado, que ainda o tratam pela alcunha de “mito”.
Se vai ter sucesso é outra história e cabe às pessoas de bom senso entender o recado e não se aventurar a nenhuma ação, que possa ter sangue como assinatura.


Jânio tinha todo um folclore que envolvia seu personagem. Bolsonaro tem o ódio a lhe alimentar.

Foto: Arquivo pessoa do professor Walter Pinto, gentilmente cedida a este jornalista que vos escreve.